Seguranç@DQB

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Tendências de regulamentação futura e o seu impacto na gestão de produtos químicos em laboratório

A rubrica da Seguranç@DQB desta Newsletter é assinada por Manuel Azenha, docente e responsável pela Comissão de Segurança do DQB.

O título deste artigo é muito próximo do título de um webinar a que assisti no dia 24 de junho de 2021, organizado pela Avantor VWR, da autoria de Michael Sieberg, um especialista nestes assuntos, da Merck.

Recomendo vivamente a sua visualização, disponível em Ver gravação (gotowebinar.com).

Como refere o autor, a União Europeia é atualmente o epicentro mundial da legislação sobre produtos químicos. As ONGs, os povos e consumidores da UE apresentam um nível relativamente elevado de exigência, para os padrões globais, relativamente à sustentabilidade na indústria e na sociedade. A pressão que colocam nos legisladores levou a UE a estabelecer metas ambiciosas de “toxic free environment” ou “zero pollution” com prazos definidos para 2030.

A regulamentação sobre produtos químicos vigente na UE, REACH, é a mais sofisticada, exigente, eficaz e complexa do mundo. No entanto, a agência europeia de produtos químicos (ECHA), responsável pela implementação do REACH, reconhece que o ritmo, lento, a que tem prosseguido a sua aplicação coloca em risco as metas de desenvolvimento sustentável para 2030. A comissão europeia concluiu, assim, recentemente, que os desafios colocados pelos produtos químicos necessitam de meios de resposta mais rápidos e eficazes.

Das muitas mudanças que podem ser antecipadas destaco aquelas que deverão ter um maior ou mais direto impacto na gestão de produtos químicos em laboratório:

  1. Uma nova forma de avaliação focada essencialmente nos perigos dos produtos químicos e menos nas suas quantidades, condições de uso etc, deverá resultar na restrição do fornecimento de muitos produtos químicos de elevada perigosidade para a saúde e ambiente, mesmo à escala de investigação.
  2. A produção/fornecimento de produtos químicos que causam especial preocupação (“substances of concern”, SoC) ficarão sujeitos à demonstração da essencialidade da sua utilização, obrigando, assim, a uma cuidadosa consideração de possíveis alternativas, bem como à ponderação criteriosa da finalidade da sua utilização.
  3. Ao nível da classificação, rotulagem e embalamento (reg. CLP) serão já adotadas no final de 2021 algumas alterações que poderão implicar uma reorganização nos laboratórios, tais como atualização de procedimentos e formações, gestão de armazenamento e de resíduos, atualização de fichas de segurança, etc. Dessas alterações, entre outras, faz parte a consideração de novas classes de perigo (disruptores endócrinos, substâncias tóxicas (muito) persistentes e de (muito) elevada mobilidade ambiental, substâncias imuno e neurotóxicas).

 

Tendências de regulamentação futura na FCUP, com impacto na gestão de produtos químicos e na segurança do trabalho em laboratórios em geral.

Na sequência do que foi descrito acima, entram, são utilizadas ou estão armazenadas na FCUP inúmeras substâncias e misturas de elevada perigosidade. Para além desses riscos químicos, os laboratórios são locais passíveis de diversos tipos de riscos biológicos, físicos e outros, de maior ou menor magnitude.

Na sua missão de assistir a Direção da FCUP na implementação das suas obrigações legais no âmbito da Saúde e Segurança no Trabalho, a comissão coordenadora de higiene e segurança no trabalho (CCHST) da FCUP tem neste momento um grupo de trabalho, do qual faço parte, focado na elaboração de uma proposta de manual de segurança em laboratórios (MSL) de aplicação genérica na FCUP, para a minimização dos riscos. A proposta, a submeter em primeiro lugar à Direção da FCUP, pretende seguir os padrões de exigência encontrados nos muitos manuais disponibilizados por instituições universitárias de referência a nível internacional (Universidade de Princeton, por exemplo) e a nível nacional (Instituto Superior Técnico, por exemplo).

Desde logo, nesse manual deverão ficar estabelecidas as responsabilidade e competências das várias instâncias relevantes neste âmbito, e que abrangem todos os que de alguma forma gerem ou frequentam, mesmo que pontualmente, os laboratórios: direção da FCUP, CCHST, Unidade de Segurança, Higiene e Sustentabilidade (USHS), comissão coordenadora da gestão de resíduos, departamentos, comissões de segurança departamentais, responsáveis de segurança de laboratório, utilizadores.

A utilização dos laboratórios deverá obedecer às normas estabelecidas no MSL, bem como prever a formação em tópicos específicos. Desta forma deverá ser atingido um elevado grau de comprometimento com práticas conducentes a um ambiente de trabalho mais seguro e saudável nos laboratórios. Como prefiguram a legislação e as boas práticas de gestão atuais, deverá ser estabelecido um sistema de acompanhamento pós-implementação, incluindo o registo e análise de ocorrências, a coordenação de auditorias e inspeções internas e externas, cujo intuito é assegurar a efetividade e melhoria contínua do MSL. O manual refletirá também, obrigatoriamente, todos os procedimentos aplicáveis que venham a ser inscritos no plano de emergência interno, que entrará em vigor assim que as medidas de autoproteção sejam aprovadas pela autoridade nacional de proteção civil.

Está, pois, em movimento um processo complexo e demorado que, espero, contribuirá decisivamente para uma elevação significativa dos padrões de segurança e higiene nos laboratórios da FCUP.

Manuel Azenha

(com um agradecimento pela revisão efetuada pela Lucinda Lima, coordenadora da CCHST)